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Rotas do Vento

Marrocos: Gargantas do Jbel M`Goun – Maria F

Um dos meus objetivos nesta viagem era saber se tinha capacidade física para fazer este tipo de viagem, e cheguei á conclusão que tenho.
Só por isso fiquei radiante. Como bónus vi um pouco de uma região montanhosa, que achei lindíssima, contactei com uma cultura bastante distinta da minha, o que achei interessantíssimo, e no fim da viagem, estava tão bem disposta, física e psicologicamente, que me achava capaz de subir aos Himalaias.
Querem mais?
Eu estou deliciada com a minha viagem mas acho que estou assim tão satisfeita porque não foi uma viagem fácil. E a dificuldade da viagem não esteve relacionada com a dificuldade do percurso, mas sim com a relação com o pessoal da equipa.
Nós éramos duas mulheres e a equipa que nos acompanhava era composta por três berberes, nascidos e criados nos vales do Atlas. Se, por um lado, esta equipa em termos de conhecimento do local, da fauna, da flora, do clima, se revelou exímia, por outro lado, a sua experiência no contacto com um grupo exclusivamente constituído por mulheres não me pareceu muita.
Bem sei que na cultura berbere os homens não servem as mulheres, pelo contrário, são as mulheres que servem os homens. São as mulheres que trabalham os campos (com exceção da tarefa de lavrar os campos), cuidam do gado, da casa e dos filhos. Mas, é que na cultura ocidental gostamos de defender a igualdade e a divisão das tarefas!
Resultado: sofremos todos um choque cultural! Nós, as mulheres ocidentais não estamos habituadas a fazer as tarefas mais duras sem ajuda, como desmontar tendas às 7h antes de tomar o pequeno almoço ou montá-las às 17h depois de um percurso a pé de 6 ou 7h, antes do lanche, e eles homens berberes não estavam habituados a ajudar mulheres. Na verdade, senti que não sabiam como se relacionar diretamente com mulheres. Ainda hoje imagino que só devemos ter causado problemas naquelas cabeças!
Esta foi a maior dificuldade. O interessante foi ultrapassá-la. A resistência e intransigência inicial de parte a parte foi-se vencendo, pouco a pouco, sobretudo á custa, acho eu, do mesmo afeto e respeito pela natureza que nos unia a todos. O facto de percorrermos uma zona lindíssima, com paisagens que pareciam escapar do nosso campo de visão de tão grandiosas que eram, deve ter-nos relativizado as convicções sociais.
E a curiosidade por culturas diferentes foi abrindo caminho, impelindo-nos à troca e à conversa.
Na minha memória espero que fiquem guardadas algumas imagens. E uma delas que, por enquanto ainda cá está, é a de um dos últimos jantares na tenda (porque o frio e a chuva fizeram-nos algumas visitas) onde depois das mulheres comerem (nós), os homens (eles) comeram ao nosso lado (não connosco, mas ao pé de nós). Esta imagem que, á partida, pode parecer de segregação, não é. Nós falávamos, eles falavam, o espaço era o mesmo e era sem dúvida o sítio mais confortável e acolhedor para estar. O ambiente era pacífico. Todos tinhamos feito concessões e todos nos sentíamos bem com isso.
Esta é uma das minhas imagens. Se foi fabricada ou não, a culpa é da memória! Mas não a quero criticar muito porque conto com ela para não esquecer estes magníficos passeios, já que as palavras parecem sempre poucas para descrever paisagens tão imponentes como estas!

Maria da Conceição F, Covilhã
15.09.05